29.11.08

tão

Vez ou outra a vida me faz tropeçar em sonhadores, fico tao sem graça diante dessas almas, é uma beleza tão desconcertante. É tão vergonhoso pensar que um dia eu proporcionei momentos de respiro aos que riram comigo e de tanto comer a realidade sem nem mesmo mastigar fiquei tão tão tão pesada que perdi a minima leveza necessária para acreditar...

em qualquer coisa.

26.11.08

mais verde na vida

Chovia na cidade e na parada em que eu esperava. O primeiro ônibus daria muita volta na cidade até chegar lá. Mas quis me molhar menos. Estava abafado, todas as janelas foram fechadas porque as pessoas preferem o mal-cheiro natural exalado pelos corpos do fim da tarde, a sentir umas gotas esparçadas de água molhando o rosto, e lembrando-nos a cada segundo que não temos o pleno controle da situação, nem teremos enquanto os céus forem abertos. De volta, de calor e de fedor se constituiu meu enjoou. Não comi a tarde, mas meu estômago estava cheio de qualquer coisa que ameaçava sair a qualquer momento.

Desci no Brasilia Shopping, (ou no museu da república, no congresso, não importa, porque Brasília não cheira a fim de tarde) não tomei quase nada de chuva. Pensei em aliviar meu enjôo com água antes do filme começar, porque a gente sempre pensa que ingerir alguma coisa resolve o problema até mesmo de estômago lotado.
- água, por favor, senhor.

As mãos cheias de verruga, que seguraram a minha água antes de mim, agitaram meu estômago, contribuindo para o enjôo.

Um deslize em meu olhar, me fez encontrar outro olhar. Esqueci as verrugas das mãos, enquanto o corpo que abrigava aquela alma, que se deixava amostra naquele olhar, se aproximava. Pude escolher desviar o olhar, mas quando as mãos saudáveis animadas por alma tão imunda me tocaram,

vomitei verde, dias e dias em pensamento e em sonho.

24.11.08

- Ô mãe, me explica, me ensina, me diz o que é feminina?
ah! somente o amor para salvar o domingo...
ou pelo menos ele teria chances de...
ajustando o tamanho dos corações
deixar os pulmões trabalharem
em paz.

22.11.08

tudo muito civilizado.

Em meio a todos os conhecidos, cumprimentaram-se. Disse-lhe um "oi, fale comigo, há quanto tempo". Ela sorriu. Ele estava diferente ( ou não?). Há muito não se viam. Se olharam. Tudo civilizadamente, é claro. Aos poucos se esvaziava a platéia. Caminharam. Conversas amenas. Perguntou como iam os dela e ela respondeu que bem, e que já havia cumprimentado os dele. Falaram rapidamente sobre seus projetos. No ar, uma promessa de marcar algo, um encontro desses que a gente vai pra não saber bem o que dizer e ensaiar tudo no pensamento antes de falar cada palavra.


Mas, se você sentir saudade, por favor não dê na vista. Bate palma com vontade, faz de conta que é turista.

20.11.08

dá nojo perebeba
dá nojo verruga
dá nojo suor
dá nojo o cheiro do onibus lotado no fim da tarde
dá nojo alma sebosa.

18.11.08

em meio ao blá blá blá surdo...
não percebes que ao não importa...
a única possibilidade de continuação é o ponto.


DO AMOROSO ESQUECIMENTO
Eu, agora - que desfecho!
Já nem penso mais em ti...
Mas será que nunca deixo
De lembrar que te esqueci?

Mario Quintana

17.11.08

aparentemente,
até o cheiro do pânico, depois de algum tempo, pode despertar boas recordações.

16.11.08

- Quem tá ai?
- só Eu...

- Desculpa, mas é muito arriscado.
- Anh? O que é arriscado?
- Você com dois copos de cerveja...

15.11.08

elogio ao feio

hoje meu olhar esteve tomado pela exagerada feiura que compunham aquele par de tornozelos finos com sapatos bregas. A poesia da cena não estava na combinação de marrom recém-engraxado, mas nas 14 presílias douradas, em que se apoiavam os cadarços sem expressão.

quando já me lambuzava no mal-gosto alheio, subi a vista, sem querer, às meias grossas de algodão. pareceu-me um digno protesto a essa geração de culto ao belo.

opz!
os pés mecheram, as pernas descruzaram, o corpo levantou. O gran finale é proporcinoado pela estrelas encravadas na areia pelo solado ANTI-DERRAPANTE.

13.11.08

cena 10

Passou a tarde inteira na cozinha. Cozinhou um arroz com cuidado e um salmão ao molho de alcaparras, para a sobremesa teriam a torta preferida dele, torta alemã comprada na doceria da esquina. Quando o jantar já estava bem encaminhado, foi até a sala, arrumou as rosas, as velas, a toalha da mesa e as taças.

Colocou o vinho para gelar e foi tomar banho. Primeiro o exfoliante, depois o sabonete, depois o óleo de amendoas, para sua pele estar impecável a noite, para que ele lhe dissesse que não havia pele mais macia, e delicadamente lhe perguntasse se poderia se embebedar em seu odor. Enchugou-se, passou o rímel, a sombra delicadamente brilhante, o batom bem vermelho. Vestiu-se de preto.

Tomou alguma coisa que estava na carteira e tocou a campanhia. Ela abriu a porta. Convidou-o para sentar e buscou-lhes o vinho de entrada que acompanharia as amenidades.

Como quem não quer nada ele disse: estou morrendo de fome. Derretendo em suavidade sua voz grave lhe responde: Então vamos jantar.

A bela mesa de rosas e velas foi complementada com o arroz e o salmão. Ela serviu os dois.
Não falaram. Ela viu flores e salmão. Já ele atribuia todo aquele maravilhoso sabor, à fatia de figado e um grande pedaço de coração de que ela lhe servira. Não conseguia olhar pra frente porque via no corpo dela o vazio de cada parte que lhe servira, passou todo o tempo olhando seu prato. Quando sem querer olhou pra frente, viu suas cavidades vazias serem preenchidas por um liquido gosmento e verde que estava na taça. Ela tomava vinho.

Finalmente acabou a etapa de romantismos desnecessários, poderiam trepar. Percebeu que era sua hora e fazer alguma coisa, levantou-se da mesa, puxou-a pela mão... pensou com certo nojo que treparia também com sua metade gosma. Ela levantou-se pensando que naquele dia poderia ser homem, e somente trepar, esquecendo da merda que fora o jantar em que eles não só nao trocaram uma só palavra, como ele nem conseguiu perceber seus olhos pintados, porque não lhe olhara.

Acompanhando os gemidos orgásticos, viu sair dela num vomito interminável toda a gosma verde de que lhe preenchera durante a relação. Era uma gosma espessa, sem fim. Ela levantou e vestiu-se, foi fazer qualquer coisa. Ele se encolheu com medo de morrer afogado no líquido que subia rapidamente em altura no quarto. E morreu, de medo. Dando-a de volta a liberdade que lhe roubara.

10.11.08

ordem das coisas

se deixas
a almofada um dia não será mais preferida,
se suja ou rasga, que pena...
mas já começou sex and the city?

7.11.08

isso também passa

Essa história começa com a morte da cachorra. A doença foi o carrapato. A maldita doença do carrapato fez o bicho ir amufinando, amufinando... até que um dia ele morreu.

O pai que não agüentava mais levar a maldita cachorra pro médico sentiu alivio, mas não contou pra ninguém. Teve vontade de mandar os meninos pararem com o chororô. Mas ele podia agüentar os meninos chorando, a cachorrinha era tão bonitinha, e eles brincavam tanto com ela.

A menina, que encontrou a cachorrinha na feira e pediu tanto pro pai comprar, começou a contar os dias que passavam dali, porque sua mãe dizia que sua cachorrinha tava no céu e que tudo aquilo ia passar. A mãe sentia falta, mas a menininha chorava tão profundamente, que as vezes só escutávamos aaaaaaaaaaaaaaaa, como se quisesse tirar do estômago toda a descrença.

Quando sua mãe saiu de casa para comprar o pão, pegou a tesoura do costureiro, ficou de frente para o espelho, como o tempo não passava nunca, cortou mecha a mecha do cabelo. Quando a mãe entrou em casa e viu o cabelo da filha perguntou o que diabos ela tinha feito com o cabelo.

- quando crescer, vou saber que tudo passou.

2.11.08

um dia?

Será que um dia a gente acorda e se sente completo, como se nada faltasse? e se esse dia acontecer, tudo perde o sentido de se buscar, ou se atinge a paz completa?